Chronicles of The Never Ending Valley - Cap 6 A Quem Você Segue?

Capítulo 6 - A Quem Você Segue?

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Após dia como aquele... tantos ferimentos... tanto sangue derramado... pela primeira vez em minha vida, tive de matar alguém. Por qualquer que seja o motivo, não sei se gostaria de continuar com isso. Entretanto, nós, os aldeões, tínhamos o direito de saber o que estava acontecendo.

 - Bravos aldeões - iniciou Ross - eu serei eternamente grato por sua bravura. Me tiraram do castelo em segurança, mesmo sem terem participado do treinamento que eu havia preparado. E no fim, sobreviveram! Isso foi realmente incrível. Lian! Quero que você prepare armas e vestimentas adequadas à estes bravos guerreiros, eles estarão com você e serão meus guarda costas.
- Está certo disso, Lord Ross? - respondeu Lian, com um tom de quem não acreditou no que acabara de ouvir

- Sim, fiel guerreiro.
- Com todo respeito, - disse Huan - Lord Ross. Sei que, ao dizer isso, estarei falando por todos nós aldeões e, sem desrespeitar sua autoridade, gostaríamos de saber por que fomos chamados para guerrear?
- Bravo jovem aldeão, como é seu nome? - perguntou Ross
- Garret, Huan Garret, senhor.
- Jovem Huan e aldeões, meus mais novos guerreiros, irei lhes contar o que houve para que esta guerra começasse...
- Senhor, eles não... - interrompeu Lian
- Tudo começou - disse Ross, cortando a fala de Lian - quando as terras do sul, além do Vale dos Ossos, descobriram que havia fertilidade em nossos campos, começaram a nos invadir, atravessando os Montes Cintilantes, na tentativa de dominar nossas terras.
- Além do Vale dos Ossos não era um local inabitado? - perguntei
- Meu jovem, vejo que conheces bem as fronteiras de nossas terras. Ouso perguntar se você já cruzou o Vale dos Ossos?
- Sim Senhor - como nunca fui de mentir, preferi me revelar de uma vez - caminhei por toda extensão de nossa província e já caminhei pelo Vale dos Ossos, mas nunca tentei cruzá-lo para saber o que havia mais ao sul.
- Você desobedeceu uma lei de nossa província. Não sabia que era proibido atravessar qualquer fronteira? - indagou Ross
- Sim senhor... - àquela altura, eu já não poderia revelar que fui à província da Papoula Azul, por causa de Leah, provavelmente expor isso apenas pioraria as coisas.
- Vendo que violaste nossa Sagrada Lei, atravessando mais ao sul, deixe-me perguntar se também não conheces uma criatura chamada Pawn?

Naquele momento, percebi que Ross queria saber se já visitei o Vale das Torres Celestes, o único lugar onde existe o único Pawn, uma espécie de lobo com seus pelos em tons de azul que se parecem ondas do mar se chocando com o céu. Todos sabem da existência deste animal, pois nossos Acólitos, nas capelas, sempre o descreveram com sendo uma criatura enviada por Deus para punir os pecadores. Mas se Ross descobrisse que infringi a Lei Sagrada de nossa província, atravessando os Montes Cintilantes até o Vale das Torres Celestes, provavelmente eu seria executado ali mesmo, pois eu não só havia visto a criatura, como fui salvo por ela enquanto caminhava pelo vale e fui atacado subitamente por Trolls saindo de um buraco no chão.

- Garoto, Lord Ross lhe fez uma pergunta, não irás respondê-la? - perguntou Lian, com um tom autoritário
- Senhor, nossos Acólitos sempre nos lecionaram acerca da existência desta criatura, mas o senhor mesmo acredita que ela exista? - respondi de maneira completamente evasiva

- SIR LIAAAANNNN! - fomos subitamente interrompidos por um guerreiro à cavalo - Os novos soldados estão à caminho. Chegarão em duas horas ao vilarejo, fui enviado à frente para avisá-los.
- Entendido! Lord Ross...- respondeu Lian
- Sim, fiel guerreiro, chegou a hora. E quanto a você, jovem aldeão - Ross disse, se referindo à mim - depois continuaremos nossa conversa.

Fomos conduzidos novamente ao pátio central do vilarejo, desta vez, foram nos fornecidas vestimentas de metal, na intenção de proteger nossos corpos durante a batalha e ficamos dispostos em uma fila separada da nova tropa. Eles vieram fortemente armados, eram homens mais velhos, pareciam touros de tão robustos. Suas armaduras pareciam bem pesadas, mas isso não os impedia de se movimentar normalmente. Todos eles carregavam espadas grandes machados de batalha, com lâminas dos dois lados, e eles pareciam ter nascido para guerrear.

Naquele momento, nós, os aldeões, nos sentimos bem inferiores, afinal, não bastasse os novos guerreiros possuirem dois metros de altura e membros fortes como os de um touro, eles foram condecorados e nomeados à tropa 'real' de Ross. Ele parecia ter se esquecido de quem o salvara recentemente, e também parecia não dar importância à seus guerreiros, nós, todos nós, parecíamos peças descartáveis, que seriam úteis apenas enquanto podemos lutar.

O discurso de Ross foi extenso, e tudo o que ele falava remetia às terras, como se tivéssemos de lutar para proteger o que é nosso, o que, de fato, é algo para se lutar, mas algo ainda me intrigava sobre esta guerra, pois se Ross estivesse correto, nossos inimigos seriam das terras desconhecidas e teriam atravessado o Vale de Ossos e os Montes Cintilantes só pra chegar em nossas terras e, como as duas últimas não possuíam patronos, eles poderiam usar os recursos dos montes e teríam de esgotá-los antes de chegar à nossa província.

- Eu vos saúdo, jovens aldeões e mais novos guerreiros de Lord Ross! - meu pensamento foi interrompido por um rapaz, aparentemente mais velho, com um sorriso feliz e o rosto cheio de marcas de ferimentos. - Sou Twain Higo, mestre e estrategista de batalha. Fui designado para treiná-los e torná-los fortes guerreiros à serviço de Lord Ross.

Ah sim, como aquela palavra já me intrigava, aos poucos fui cansando de ouvir "Lord Ross isso" ou "Lord Ross aquilo", como se ele fosse algum tipo de deus ou ser mais poderoso. Ficava imaginando como foi que ele conseguiu construir aquele exército só pra ele.

Durante os meses seguintes, houveram vários ataques ao Vilarejo Mestre, mas com os novos guerreiros, nada havia a temer, pois dizimavam os inimigos com tanta facilidade que eu mesmo cheguei a pensar que éramos completamente desnecessários. Neste período, fomos lecionados sobre guerras, estratégias, a arte de surpreender o inimigo, e várias outras disciplinas bélicas, incluindo combate corpo à corpo e finalmente, aprendemos a usar a arma que havíamos escolhido pra lutar à primeira vez. Twain realmente era um guerreiro e um mestre, aprendemos muito com sua sabedoria e conhecimento, mas por algum motivo, ele não participava das batalhas, apenas dava ordens e isso me deixou bastante curioso ao longo do tempo.

O treinamento havia terminado, estavamos prontos à receber nosso títulos de guerreiros, para finalmente participar do exército de Ross, pois este planejava atacar a província ao sul e acabar com esta guerra de uma vez por todas. Faltando apenas um dia para recebermos nosso tão merecido título, eu notei que alguns dos novos guerreiros, os touros, estavam se embriagando durante a vigília, ao invés de ficarem à seus postos. Percebi que, se os inimigos vissem tal brecha, não hesitariam em fazer uma estratégia para atacar aquele ponto vulnerável. Logo fui avisar Twain, perguntando-o o que eu deveria fazer.

- Mestre Twain, é com louvor que lhe agradeço por tudo o que me ensinou sobre Deus e nossos ideais para guerrear. - houveram disciplinas sobre Deus e nossas terras abençoadas também, éramos chamados A Província Santa - Mas devo dizer-lhe que, tentando por em prática o que aprendi, notei uma brecha em nossa defesa, um ponto vulnerável que pode ser facilmente derrubado.
- Guerreiro Joshua, antes que me diga o que houve, e meu conselho não mudará depois de ouvi-lo, tenha em mente que, quando Deus lhe mostra algo que ninguém mais viu, é porque aquele é o seu destino e você deverá tomar as providências. Em outras palavras, se você viu a brecha, você deve se dispor em nome de Deus, para protegê-la.
- Mestre Twain, não me ensinará o que devo fazer nem mesmo irá comigo?
- Já é de seu conhecimento que eu não participo das batalhas...
- Mas os novos guerreiros não irão escutar um garoto ainda não nomeado guerreiro, como eu.
- Eles são chamados de Táureos, e realmente não te escutarão... então feche a brecha com sua vida.
- Hmpf... pensei que seu título de mestre vinha das inúmeras batalhas já vencidas, mas percebo que alguma coisa o impede de colocara 'mão na massa'. Com sua licença, senhor Twain, me retiro.

Ali eu já estava decidido que Twain não passava de um homem que sabia tudo de livros de guerra e estratégias, mas não era um guerreiro de verdade. Parecia ter medo de algo durante as batalhas, mesmo nos dizendo "Quando o medo tomar conta de seus corações, lembrem-se que vocês vieram lutar em nome de Deus, e das terras abençoadas de Lord Ross!" . Mas isso também não parecia surtir efeito sobre ele... Lord Ross, o que ele tem de tão sagrado? Por que nossas terras são abençoadas? Eu não tinha resposta pra maioria de minhas perguntas, mas sempre era fiel à Deus, com tudo o que aprendíamos no Livro Sagrado. Mesmo não tendo respostas, eu tinha um objetivo, naquela noite eu lutaria pra defender os pontos vulneráveis do vilarejo.

Éramos sete guerreiros aldeões, não nomeados, e pelo que eu pude perceber, os pontos vulneráveis eram quatro. Mesmo que nos dividíssemos em duplas, um dos pontos seria guardado apenas por um de nós. Não sei se pelo tempo de convivência ou pelas atitudes demonstradas, todos nós tínhamos o perfil de um líder, mas por algum motivo, todos respeitavam minhas decisões e não queriam me deixar "tampar as brechas" sozinho. Nos dirigimos para a extremidade norte do vilarejo, logo depois dos Táureos adormecerem embriagados.

- Todos esses meses estudando e treinando, Lord Ross isso e Lord Ross aquilo, sinceramente ainda não sei por que ele é considerado um enviado de Deus. - reclamou Elch
- Eu fiquei calado todos estes meses porque não sabia o que vocês pensariam quando eu dissesse, mas agora que Elch já começou o assunto, eu também não vejo nada de sagrado naquele cara. - continuou Huan com um tom indignado
- Ah, por mim tanto faz... - Axel, como sempre, de pouca, ou nenhuma opinião
- Tem algo que não nos foi dito sobre esta guerra, tudo está muito simples e muito perfeito. Parece que nossa província é perfeita demais para todas as outras virem e simplesmente nos invejarem... - respondi em tom pensativo
- Eu apenas sigo ordens, não me preocupo com seus fundamentos. Vivi assim e não pretendo mudar. - Wolger era um dos aldeões que eu conheci ao longo de nosso treinamento, um dos sete que ficaram de pé ao salvar Ross.
- O que quer que venha a acontecer, eu simplesmente sigo a tradição, o Livro Sagrado nos deu tudo o que precisamos pra seguir. - disse Ron, outro dos sete.
- Uma coisa que eu quero desabafar - iniciou Huan - eu realmente odiei o modo como Ross me chamou desde que soube de meu nome. Aquele tom ridículo e afeminado de dizer "Ah jovem Huan". Grrrrr aquilo me irrita! De agora em diante, quero que me chamem pelo meu sobrenome.
- Garret!?! - exclamei
- Ah assim está bem melhor. - disse Huan, agora chamado de Garret, ele exclamou com tanta felicidade que parecia ter se livrado de um fardo bem pesado
- É, olha o tamanho do Táureo embriagado ali. Ainda vou ficar igual à um desses! - exclamou Doan, o sétimo aldeão, olhando para a entrada do vilarejo.
- Todos aos seus postos e, não se preocupem comigo, ao sinal de perigo, vocês sabem qual é o sinal. - disse eu, ignorando o que Doan acabara de dizer.

Todos ficamos à postos, Elch e Garret à esquerda do portão norte, Wolger e Axel à direita, Ron e Doan mais afastados ao leste e eu na linha de frente ao nordeste, para avisar da chegada do inimigo. Como por presságio, o inimigo parecia ter percebido nossos pontos vulneráveis com os ataques ao longo dos meses. Ora, o portão norte era pouco guardado porque o Vilarejo Mestre ficava ao sul, próximo à fronteira, e o lado norte fazia parte de toda extensão de nossa província, fazendo fronteira com a Província da Papoula Azul, os quais não eram nossos inimigos. Mas percebendo isso, os inimigos adentraram nossas terras ao norte, planejando um ataque surpresa vindo do portão menos guardado do vilarejo.

Noite adentro, sozinho naquele pedaço de terras, enquanto vigiava ao norte, vultos se aproximando na escuridão interrompem a calmaria do vento. Passos rápidos são ouvidos enquanto eu sinalizo aos meus companheiros, usando uma flecha incandescente no céu, na direção do inimigo. Rapidamente fui localizado por eles.

Agora eu seria o alvo principal... mas uma convicção eu tinha: "Eu luto em nome de Deus."


Fim do Capítulo 6

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